
Serra Dois Irmãos
Zumbi
Profundezas da paisagem, funduras da alma. Fuma cachimbo Zumbi, perdido o olhar nas altas pedras vermelhas e nas grutas abertas como feridas, e não vê que nasce o dia com luz inimiga nem vê que fogem os pássaros, assustados, em revoadas.
Não vê que chega o traidor. Vê que chega o companheiro, Antônio Soares, e se levanta e o abraça. Antônio Soares afunda várias vezes o punhal em suas costas.
Os soldados cravam a cabeça na ponta de uma lança e a levam para Recife, para que apodreça na praça e os escravos aprendam que Zumbi não é imortal.
Já não respira Palmares. Tinha durado um século e tinha resistido a mais de quarenta invasões este amplo espaço de liberdade aberto na América colonial. O vento levou as cinzas dos baluartes negros de Macacos e Subupira, Dambrabanga e Obenga, Tabocas e Arotirene.
Para os vencedores, o século de Palmares se reduz ao instante das punhaladas que acabaram com Zumbi. Cairá a noite e nada ficará debaixo das frias estrelas. Mas, que sabe a vigília comparado com o que sabe o sonho?
Sonham os vencidos com Zumbi; e o sonho sabe que enquanto nestas terras um homem seja dono de outro homem, andará o seu fantasma. Mancando andará, porque Zumbi era manco por culpa de uma bala; andará tempo acima e tempo abaixo e mancando lutará nestas selvas de palmeiras e em todas as terras do Brasil. Se chamarão Zumbi os chefes das incessantes rebeliões negras.
20 de novembro DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA